terça-feira, 18 de novembro de 2014

2014, O ANO QUE NÃO VAI ACABAR!




TRANSPONDO VEREDAS

A conjuntura brasileira vem passando por veredas contraditórias, íngremes, onde as previsões são abaladas, e as certezas não são abundantes.

Por isso é um momento em que os “corações valentes” se destacam e abrem caminhos, consolidam traçados.

Os trabalhadores tem conseguido abrir picadas efetivas no rumo de uma inserção social com mais dignidade.

Como filosofa Guimarães Roda “o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente no meio da travessia”. (1)

No processo eleitoral de 2014 abriram-se enormes clareiras. Ficou muito mais evidente a justeza da proposta que aponta a necessidade de uma verdadeira Revolução Democrática no Brasil.

O processo político que está em curso não começou nas eleições deste ano e não vai acabar com a vitória progressista. A direita continua e vai continuar seus ataques.

Foi uma grande vitória, enfrentamos uma ofensiva conservadora e de direita incessante, capitaneada pela grande mídia, sintetizando uma estratégia que era articulada em vários setores.

É correto afirmar que os governos Dilma e Lula tiveram problemas. O PT teve deficiências, equívocos e lacunas. Mas é mais evidente ainda os avanços produzidos. E as urnas mostraram que o povo quer mudança e não quer voltar para trás.

O conservadorismo saiu da toca e está mostrando sua face reacionária. Não deixa de ser positivo, pois agora as coisas estão mais claras e precisamos ser competentes para aproveitar a nitidez política deste momento. Contra a tentativa de retrocessos aprofundar a Revolução Democrática.

A DEMOCRACIA É SUBVERSIVA

Como afirma Adolfo Vazquez, uma democracia que, ao superar os limites, se amplie em um processo ininterrupto de participação. Como a democracia exige uma participação consciente e racional na tomada das decisões que afetam a comunidade, e toda vez em que esta participação é uma exigência de liberdade, a democracia é um valor a que não se pode deixar de aspirar. E ao mesmo tempo em que a realização deste valor requer superar seus limites reais, a democracia, dada sua necessidade de estender-se ou aprofundar-se, é subversiva.

Gostaria de enfatizar um elemento que julgo central para uma efetiva democratização da sociedade e que muitas vezes é secundarizado. Me refiro aos espaços de produção, às relações de trabalho e consequentes relações sociais.

Apesar de extrema importância, não basta disputar “as ondas do rádio e da TV”. Devemos disputar as consciências em sua materialidade, nas relações sociais reais onde, no cotidiano, os trabalhadores constroem seus valores.

Norberto Bobbio diz com razão que a democracia no sistema atual encontra uma barreira insuperável nas portas das fábricas. Precisamos nos voltar para os ambientes de trabalho, democratizando-os, disputando o imaginário dos trabalhadores pois as empresas estão a fazê-lo, onde a meritocracia é o mantra e estão produzindo individualistas.

Também devemos ter presente que a consciência de classe, além dos locais de trabalho, é produzida e veiculada nas ruas, bares, pubs, cozinhas, capelas, centros comunitários e quintais dos subúrbios da classe operária.

Boaventura de Souza Santos resume adequadamente a questão afirmando que o “espaço da produção hoje é mais central do que nunca e a sua hegemonia aumenta com a difusão social da produção, com a ideologia do produtivismo e do mercado, com a compulsão do consumo”.

Ainda concordando com Boaventura, uma das tarefas centrais para a Revolução Democrática consiste na politização do espaço de produção. “A fábrica é um micro-estado onde é possível detectar instituições similares na forma e aparência do campo político liberal, só que muito mais despóticas (o direito da produção, a lealdade à empresa, a distinção entre o público e o privado, a representação dos trabalhadores, as coligações, etc.)”.

O desafio é construir dois tempos coexistentes. O espaço da experiência – não deixar retroceder – e espaço de expectativas – necessidade de avançar substancialmente.

NA TRILHA DO MOVIMENTO SINDICAL

O movimento sindical enfrenta situações complexas. O mundo do capital está horizontalizado, nossos sindicatos ainda são verticais, da era fordista. Têm sido incapazes de se horizontalizar, de tornar-se mais classistas, de incorporar os excluídos. Este é o primeiro desafio, se queremos dar vitalidade aos sindicatos.


O desafio é calibrar as lutas imediatas a um projeto global anticapitalista, “tocar” o dia-a-dia da categoria integrando com as questões gerais, compreendendo e fazendo compreender que a melhoria da saúde, de garantias previdenciárias, salariais, etc., não é efetiva somente com a luta de uma categoria isolada, é necessário unir forças sociais.

Devemos buscar contribuir na construção uma estratégia de longo alcance, ousada e criativa, onde o próprio movimento sindical deve questionar-se de alto a baixo.

“É melhor que seja o movimento sindical a questionar-se a si próprio e por sua iniciativa, até porque, se o não fizer, acabará por ser questionado a partir de fora”, provoca Boaventura Santos.

O sindicalismo já foi mais movimento que instituição. Hoje é mais instituição que movimento.

Temos de rearticular um amplo movimento que tenha bandeiras comuns e ações integradas, superando o sectarismo. O sectarismo, a negação de ouvirmos-nos uns aos outros e compartilhar opiniões na tentativa de construir novas sínteses tem sido muito presente entre nós. O senso comum e a repetição mecânica de velhas e novas “palavras de ordem” substituem a boa e velha prática da observação, do estudo e da discussão.

Como a política é a arte de construir a força social e a política capaz de mudar a realidade, tornando possível no futuro aquilo que hoje parece como uma impossibilidade, o momento impõe oferecer à sociedade alternativas 'que se pode tocar com as mãos'.

O REAL RODA E PÕE ADIANTE (1)

Diante desse contexto afirmar, reafirmar e firmar o timão na direção de uma Revolução Democrática efetiva torna-se imperativo.

A luta por uma reforma política tem que estar casada com a regulamentação da mídia e na construção de canais progressistas de comunicação para contrapor ao golpismo midiático. Regulamentação da mídia e reforma política, ovo ou a galinha. Será possível realizar mudanças democráticas profundas sem antes democratizar a mídia? Creio que a ofensiva deve ser conjunta, concomitante, e necessita de ampla mobilização.

Todavia, a Reforma Política não pode ficar restrita ao sistema eleitoral – sem dúvida que é de extrema importância. Mas devemos buscar o futuro e além , avançando em mecanismos de participação direta e na democratização nas relações de trabalho. Empoderar o povo, eis a grande tarefa. Organizar o povo, eis o grande desafio.

Claro que não podemos desprezar a correlação de forças. Mas para pender para o lado progressista, precisamos incidir com firmeza, coragem e inteligência. Acima de tudo, precisamos ser ofensivos, cunhando consignas que dialoguem com os anseios sociais a fim de colocar em movimento as forças mudancista. Se assim não for, podemos amargar com reformas retrógradas.

O Governo Dilma não pode retroceder nas promessas na campanha pois ficará sem o povo e refém do conservadorismo. Mas é uma equação difícil de solucionar.

O modelo de governabilidade que ainda impera é de pactuação com um congresso ainda mais conservador. A grande mídia continua com um poder brutal. E ainda precisamos consolidar uma organização popular que tenha capacidade de mobilização, ocupando as ruas para sustentar as mudanças.

Urge garantir efetivos mecanismos de empoderamento popular, com ampliação de direitos e reformas estruturais. Criar mecanismos para que a democracia chegue nos locais de trabalho onde vigora outro código civil e penal.

Para isso o movimento social e o movimento sindical, em especial, necessitam remexer-se, chacoalhar-se para estar a altura do momento histórico.

Temos um mundo cheio de protestos. Pessoas que se mobilizam porque acham que tem algo muito errado. Mas existem muitos muros que separam estas lutas, “tantos diques as impedem de fluírem umas nas outras”. O desafio é romper essas represas e unificar nossos protestos.

Talvez o momento seja o de formular perguntas para essa realidade complexa. Respostas estão sendo dadas e respostas precisam ser buscadas. Para isso precisamos de perguntas bem elaboradas para que achemos, juntos, as respostas.

“Perguntando, caminhamos”, dizem os Zapatistas. Nós perguntamos não só porque não temos todas certezas sobre o caminho, “porque perguntar pelo caminho é parte do próprio processo revolucionário”, nos lembra Holloway.

Acima de tudo o momento impõe encantar o povo. Quando o povo sente firmeza e clareza sobre o que buscar e lutar não vacila e vai à luta.

E unir a esquerda, torna-se tarefa primordial, o antídoto à tentativa raivosa do reacionarismo de impor retrocessos.

Tudo com urgência meteórica, nos caminhos do lado iluminado do cometa Brasil, não permitindo que o lado escuro descarregue as baterias populares.

O tempo "ruge" e como bem diz Saul Leblon, a esquerda não tem mais o direito de perguntar que horas são.

Eis os desafios, desanuviar, achar os caminhos. “A liberdade é assim, movimentação”.(1)

(1) Guimarães Rosa – Grande Sertão: Veredas

Texto compeleto:

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