terça-feira, 26 de janeiro de 2016

SINDICATO E CULTURA, TUDO A VER!


                                         
                                               Desintrincar o real no interior do imaginário. (Safatle)

O que a cultura tem a ver com sindicato?



Respondo com outra indagação: Como pode o sindicalismo desprezar a ação cultural se pretende ter uma postura transformadora, contra-hegemônica?



Embora pareça secundária ou mesmo irrelevante, a questão cultural deveria ser considerada uma das prioridades do movimento sindical.



A cultura cumpre vários papéis na vida social. Seja como fator de discriminação sociopolítica, seja como instrumento de dominação ideológica, seja como forma de resistência das classes dominadas, seja, enfim, como forma de criação com potencial de emancipação e de libertação histórica.



Se a cultura fosse algo de menor importância, seria incompreensível a atenção que lhe é dada pelo Estado contemporâneo e a expansão dos meios de comunicação de massa como instrumentos de legitimação da ordem vigente e de conformismo social e político.



Torna-se ainda mais relevante nos dias atuais, onde a batalha simbólica é a principal luta que está sendo travada.



A realidade atual torna cristalina a afirmação de Marx de que “a classe dominante tem o monopólio da produção e difusão das ideias” (controle dos modos de produção intelectual).



Só que avançaram ainda mais na dominação. Hoje também “tem o monopólio da produção de emoções”.



A guerra do Iraque é um exemplo de manipulação. Esbanjaram mentiras e ilações para justificar a invasão – combate ao terrorismo -, onde manipulam emoções de ódio e medo dos muçulmanos. Sabemos que os objetivos reais são econômicos e geopolíticos.



O que fazem no Brasil não fica atrás. O ódio, o preconceito saiu do armário e é destilado por variados setores contra a esquerda, escamoteado na luta contra a corrupção.



São manipulações que escondem interesses “que não se podem exercer à luz do dia”. Constrói e reproduz o senso comum, uma verdadeira “violência simbólica”, onde amplas parcelas, sem dar-se conta, defendem situações que deveriam criticar pois são contra seus reais interesses.



Diante disso é importante construir uma política cultural consistente, desenvolvendo uma crítica criativa e competente contra o senso comum e suas ilusões.



Devemos construir um movimento cultural que questione o instituído, que integre as variadas expressões culturais de um mundo paralelo pulsante, que seja um difusor de visões transformadoras.



Pensar uma política cultural deve incorporar a preocupação da superação dos limites do sindicalismo que, nos dias atuais, avança célere para o aprofundamento da burocracia e do economicismo.



Essas “doenças senis do sindicalismo”, corroem a necessária disputa pela hegemonia social, onde o embate por visões e perspectivas de mundo, que coloque o ser humano como central, pressupõe práticas e políticas também transformadoras.



Torna-se necessário, também equacionar a questão do imediato versus o permanente e buscar condições para que na ocorrência do primeiro não precise o segundo parar.



A formação e uma política cultural permanente, que não fiquem dependentes dos “espaços livres” da luta economicista, não significam departamentos funcionando e uma diretoria alheia. Pelo contrário, devem estar no dia a dia do dirigente sindical.



Tampouco deve significar somente como produção de eventos. Os sindicatos devem propiciar espaços para a expressão humana, para o exercício solidário, crítico, criativo e libertário.



Devem servir para alimentar e alargar sonhos, utopias e ajudar a construir outro modo de vida: um viver partilhado por todos com dignidade, igualdade e felicidade.



Portanto, diante das profundas mudanças no mundo do trabalho, onde o capital desenvolveu formas sutis e sofisticadas de exploração, com o Estado e a sociedade civil sendo redefinida, a questão cultural não pode continuar sendo secundarizada pelos sindicatos.



É um campo rico para imprimir um “novo” sentido ao fazer sindical. Sentido que nasce da necessidade de compreender o trabalhador como um ser humano por inteiro e não um mero vendedor da força de trabalho, papel a que é reduzido pelo sistema capitalista.



Mas para indagar é preciso conhecer, formar gosto, ganhar competência para integrar signos e códigos.



Mas não são somente interrogações o que nos move. Precisamos exclamar, afirmar nossas identidades, nossos valores.



Em lugar de determinar (ou impor) ações e condutas, devemos estimular a criatividade, potencializando desejos e criando situações de encantamento social.



O desafio é permanente, sempre buscando garantir o protagonismo da categoria, em um processo de envolvimento, construído coletivamente pelas pessoas; fazendo, lutando e sonhando, pois essa é a nossa cultura.






quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

TEMPOS ABISSAIS






 

As coisas mudam no devagar depressa dos tempos” (Guimarães Rosa)



O tempo presente no Brasil está sendo escrito por linhas abissais.



Por mais que o mundo real seja manipulado, produzindo uma névoa sobre os fatos, a política está sendo demarcada.



A cada dia ficam mais nítidas as intenções das elites. Levar o Brasil ao abismo onde os monstros neoliberais buscam voltar com força, sem ter ido.



Com toda volúpia buscam desestabilizar um projeto popular, de nação soberana, menos desigual, com ampliação de direitos sociais.



Para sairmos desse labirinto que se tornou a “conjuntura Brasil”, devemos percorrer os caminhos com a bússola popular.



Essa caminhada sem fim deve ser feita compreendendo as armadilhas plantadas pelas elites.



Mas acima de tudo achar as causas mobilizadoras, com atitudes encantadoras que envolvam, efetivamente, os trabalhadores e os progressistas da nação.



2014 não acabou!



O presente concreto é resultado do passado e está prenhe de futuro”. (Hegel)



Desde 2014 as elites intensificaram seus ataques ao projeto progressista. Tentam golpear a constituição buscando o impedimento da presidenta e também se movimentam para saídas pelo “centro” que nada mais é que uma cortina de fumaça para impor os mesmos objetivos, voltar ao poder e aplicar sua agenda.



O governo Dilma navega nestes mares tortuosos. Seu maior erro é insistir com a política econômica recessiva. Cedeu à ditadura do capital financeiro que potencializa uma crise política sem fim. Submeteu-se às chantagens, tanto do sistema financeiro como dos arranjos políticos das elites, dois temas que, aliás, submetem a sociedade mundial.



Portanto, sustentar-se na pauta popular e reorientar a economia são imperativos, mesmo sendo das tarefas mais difíceis.



2015, resistência popular.



O mal dos tempos de hoje é que os estúpidos vivem cheios de si e os inteligentes cheios de dúvidas”. (Bertrand Russell)



Durante o ano de 2015 os democratas e progressistas sofreram uma pesada ofensiva. Resistimos com perseverança, sendo os Movimentos Sociais decisivos para equilibrar o jogo. E foi dado o recado: não ao golpe, muda política econômica e retoma programa vencedor.



Um ano em que utilizamos de nossas melhores armas. Unidade e mobilização nas ruas com a construção de pautas comuns que deram visibilidade ao confronto – Defesa dos direitos e da democracia e pela mudança da política econômica.



Tendo uma causa justa e aglutinadora o povo vai à luta.



A mobilização contra a reorganização da educação em São Paulo é cheia de ensinamentos. Uma causa concreta, justa. Houve uma ação organizada, ousada, que enfrentou a agenda das elites e aglutinou apoios dos mais variados



A luta contra o PL 4330 também foi um exemplo concreto de potencial aglutinador quando a causa é nítida e essencial. Muita mobilização, paralisações, pressão no Congresso e nas ruas.



A Diminuição da maioridade penal também foi neutralizada.



Quem diria que num momento conturbado como foi o ano de 2015 fosse aprovado o fim financiamento empresarial?



Tanta pauta retrógrada mostraram a sanha conservadora que busca arrastar o Brasil para o atraso. Mas a resistência popular mostrou que não passarão.



A grande causa do momento é a democracia. Em torno dela unificam-se amplos setores, apoiadores ou não do governo. Um golpe dessas proporções seria trágico para a recente democracia brasileira.



Sem democracia os mais penalizados serão os trabalhadores e o povo pobre. O passo seguinte à destruição da democracia é a liquidação de direitos sociais e trabalhista e o ataque a conquistas civilizatórias.



Aliás, já está a ocorrer, é só olhar com atenção a agenda conservadora imposta por Eduardo Cunha e seus asseclas no Congresso Nacional.



Mas também urge recolocar o debate de qual modelo de sociedade almejamos. Essa política econômica não serve. Buscar mudanças na previdência e nos direitos trabalhistas é declarar guerra a quem sustentou o governo enfraquecido. Não pode tratar com desdém a quem sempre lhe deu a mão.



2016, em busca do tempo perdido.



as pessoas não se rebelam quando 'as coisas realmente vão mal’, mas quando suas expectativas são frustradas”. (Zizek)



2016 está em aberto. Os atores estão em movimento. Baixar a guarda é suicídio. Desconhecer a polarização, achando que se pode contentar a todos é um equívoco abissal. As elites não descansarão, é uma luta de longa duração.



No final de 2015 e início de 2016 tivemos duas notícias. Uma boa e outra ruim.



A boa, foi a troca do Ministro da Fazenda que claramente defendia uma agenda neoliberal.



O ruim, foram as declarações do novo ministro da fazenda sobre reforma da previdência e trabalhista, especialmente quanto a mudança na idade mínima para aposentadoria e da prevalência do negociado sobre o legislado nas relações trabalhistas. Pautas que desde os tempos de FHC tentam impor que conseguimos evitar com muita luta.



O povo brasileiro precisa de sinalizações concretas da aplicação de uma outra agenda.



Caso não tenha caído a ficha do Governo Federal, poderá haver “problema no paraíso” e o povo pode sair do sofá, causando um curto no “circuito dos afetos”, com os movimentos tendo que construir novos caminhos.



Portanto, do lado de cá, do campo popular, está muito bem demarcado. Nenhum direito a menos, não ao golpe. É isso e mais além. Queremos avançar com reformas populares substantivas.



Sou do tempo em que debatíamos a necessidade de aprofundar a luta de classes. Parece que atualmente quem busca isso são as elites e consideráveis setores do campo popular iludindo-se nas possibilidades de pactos.



Precisamos deixar claro o abismo que separa as posições em jogo. Mostrar quem está do lado de lá e quem está do lado de cá e o que defende cada lado.



Do lado de cá do precipício sabemos que tomar as ruas e organizar o povo é essencial.



Não vamos deixar-nos levar para o buraco nem nos iludir com pontes que nos levam a lugares indesejados.

O Governo tem que ajudar, retomando a agenda de 2014 que garantiu a vitória eleitoral. Isto é essencial para que a nitidez necessária dos lados em disputa fiquem cristalinos e facilite o convencimento da maioria popular.



Tem o tempo das elites e o tempo popular. “Nossos horários nunca combinam, eu sou funcionário e você especulador/conspirador”.



Buscar o tempo perdido ou vamos continuar perdido no tempo incerto, eis uma questão.



Em 2016, espero – não sentado – que os caminhos sejam desobstruídos e os avanços necessários sejam transportados para a vida popular, com nenhum direito a menos.
Uma certeza, na sociedade do espetáculo não seremos meros espectadores.