quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011
POR UMA SUBSTANTIVA PARTICIPAÇÃO DOS TRABALHADORES
O amigo Eric Calderoni postou um comentário interessante.
Enfatiza a "necessidade de amadurecermos o debate dentro do movimento social, sindicatos e academia, sobre a viabilidade das ferramentas de combate à humilhação sistemática no trabalho".
Afirma que, "se por um lado, tem sempre o macro-Marxismo, válido, de que enquanto houver expropriação, haverá exploração, que leva à estropiação e má distribuição, por outro lado, podemos, comendo pelas bordas, pensar em formas de irmos melhorando as atuais relações de trabalho, até mesmo como forma de conscientização do trabalhador".
Questiona: "Quais ferramentas seriam realmente efetivas? Em que direção deveria atuar o movimento social/sindical no que se refere a isso?”
Em minha opinião as instituições de segurança não estão conseguindo dar conta dessa realidade.
Se esperarmos pelo Estado os trabalhadores continuarão morrendo.
É precária a estrutura dos organismos e instituições responsáveis pela proteção à saúde dos trabalhadores.
As empresas adotam medidas cartoriais, um aparentar fazer, a fim de fugir de eventuais fiscalizações ou ações judiciais.
Como exemplo da ineficácia dos PCMSO relato um caso onde o Sindbancários de Porto Alegre solicitou uma audiência de mediação na DRT objetivando discutir a qualidade do seu PCMSO de um banco.
Foi entregue ao sindicato uma cópia do referido programa, que segundo a médica responsável apresentava todos os requisitos legais.
As contradições saltavam os olhos. Ao mesmo tempo que reconheciam que o trabalho bancário apresenta um grau de risco 2, em todas as funções relatadas no programas a opinião do médico era: “RISCOS INEXISTENTES”.
Nenhum exame apresentava anormalidades, embora dois bancários do referido banco, do departamento investigado, estivessem afastados do trabalho, com um amplo histórico de sequelas decorrentes do trabalho.
As CIPAS que poderiam ser um instrumento de empoderamento dos trabalhadores estão, em sua maioria, instrumentalizadas pelos SESMT das empresas.
O controle social é um conceito limitado. Cotidianamente os trabalhadores são vítimas de violência sem interlocutores efetivos.
Na superação dessa realidade não existem fórmulas prontas. Mas existem referências.
Creio ser necessário reafirmar o princípio da não delegação. Não podemos nos iludir com mudanças “pelo alto”.
Ao institucionalizar-se o movimento atua em terreno onde o capital tem grande mobilidade.
Não delegar não significa isolar-se, excluir parceiros. Pelo contrário, o próprio Modelo Operário Italiano foi construído com a ajuda de técnicos e vários avanços conquistados no Brasil foi com parcerias entre variados atores.
Mas o diferencial é que os trabalhadores devem ser protagonistas destacados.
Creio ser imprescindível uma substantiva participação social, garantindo autonomia e liberdade de organização aos trabalhadores, criando instrumentos de empoderamento, como o direito de fiscalizar os ambientes de trabalho pelos sindicatos.
Porque não incorporar de forma efetiva os sindicatos na rede de vigilância em saúde, empoderando essas entidades, aproveitando sua capilaridade e proximidade com os trabalhadores?
Estão a ocorrer variadas iniciativas interessantes, mas acabam por ser isoladas, uma vez que não fazem parte de um processo sistêmico, que incorpore, de fato, o protagonismo dos trabalhadores.
Não perdendo de vista que o modo de produzir capitalista é produtor de violência, precisamos dar efetividade a nossa pauta, a nossas exigências.
Quando conseguimos avanços foram fruto de estratégias e ações comuns, com mobilização social.
A luta pelo reconhecimento das Lesões por Esforços Repetitivos é um exemplo disso.
No atual momento necessitamos rearticular um amplo movimento que tenha bandeiras comuns e ações integradas. O rebaixamento de nossas demandas precisa ser superado.
Como afirma Boaventura Santos, “transformar estratégias de sobrevivência em fontes de inovação, de criatividade, de transgressão e de subversão.”
Ser radicais na defesa da saúde. Radical no sentido que Marx defendia:
“Ser radical é tomar as coisas pela raiz, e a raiz para o homem, é o próprio homem.”
domingo, 20 de fevereiro de 2011
segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011
SANTANDER FORA DA LEI
O Banco Santander foi condenado pela justiça a pagar R$ 40 milhões por dano moral coletivo.
Uma vitória importante na luta contra o assédio moral, às exigências de resultados a qualquer custo, a todas as formas de violência sofrida pelos trabalhadores.
Foi êxito da ação coletiva contra a lógica individualizante, do cada um por si.
Desde 2002 o Sindicato dos Bancários de Porto Alegre vinha denunciando o banco por discriminação aos portadores de doenças ocupacionais e por atitudes de desrespeito aos direitos dos funcionários.
Foram provas documentais e testemunhais onde o os trabalhadores do Santander, participantes do Grupo de Ação Solidária do Sindicato, tiveram ativa participação.
A DRT comprovou as denúncias e o MPT acolheu o pleito, abrindo Inquérito que culminou com uma Ação Civil Pública julgada procedente pelo judiciário.
O Ministério Público do Trabalho na inicial sintetizou a verdadeira cultura do Santander: “...os réus, solenemente, desprezaram a lei, trazendo desconforto à sociedade e merecendo o repúdio desta pela fronta aos dispositivos constitucionais e legais […] A conduta ilícita dos réus, devidamente comprovada nos documentos anexos, afronta não só as garantias e direitos internos constitucionais, como norma convencional da OIT...”
A juíza, no despacho, afirmou o seguinte: ...”restou manifesto nos autos que os réus agiram em evidente afronta ao princípio constitucional basilar da dignidade da pessoa humana...”
A Sentença determina que o Banco Santander não submeta, permita ou tolere que seus empregados e ex-empregados sofram assédio moral, proibindo a exposição destes a qualquer constrangimento moral, especificamente em decorrência de humilhações, intimidações, ameaças veladas, atos vexatórios ou agressividade no trato pessoal.
O Santander deverá emitir Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT) sem questionamento sobre a existência de nexo causal da doença com o trabalho.
O Réu deverá elaborar e implementar relatórios anuais do PCMSO com planos de ações para monitoramento dos empregados que retornam ao trabalho após afastamento por doença, bem como plano de ações para adaptações dos empregados portadores de doenças ocupacionais, reabilitados ou não ao trabalho.
Em caso de descumprimento deverá pagar multa diária de R$ 20 milhões por empregado prejudicado.
Citado por Marx n'O Capital, o jornal Times, em 1861, já retratou com clareza a situação dos trabalhadores, que persiste até os dias atuais:
“Embora a saúde da população seja um elemento tão importante do capital nacional, receamos ter de confessar que os capitalistas não se sentem inclinados a conservar e zelar por esse tesouro e dar-lhe valor […]. A consideração pela saúde dos trabalhadores foi imposta aos fabricantes”
terça-feira, 8 de fevereiro de 2011
ILUSÃO SINDICAL
Venho afirmando e demonstrando a dura realidade dos trabalhadores e da categoria bancária em especial.
É a violência cotidiana que assola os ambientes de trabalho com consequências físicas e mentais.
Pressão para atingir resultados, medo de não estar apto e ser demitido, ritmo intenso, controle das tarefas e da vida do trabalhador.
O vídeo acima é uma pequena demonstração do problema. O Bancário não se identificou pois haveria represália. Ainda existe um “código penal” nas empresas, onde a democracia não transpôs as portas dos locais de trabalho.
Há tempos o movimento sindical denuncia a situação e busca negociar medidas para mudar essa realidade, especialmente quanto à violência organizacional e o assédio a que são submetidos os bancários para atingir resultados.
Recentemente a Confederação dos Bancários (CONTRAF), com bastante alarde, assinou um acordo com os bancos buscando amenizar a situação.
Infelizmente, em nossa opinião, a proposta acordada é no mínimo inócua, tendendo a trazer prejuízos.
Não significa negar-se a negociar, buscar avanços, mesmo incompletos. Mas o imediatismo que prevalece na ação sindical não pode impedir a estruturação de estratégias que possam se contrapor à lógica perversa do capital.
O acordo em questão deixa muito pouco espaço para enfrentar a realidade de violência e pode deixar vulneráveis os bancários.
Portanto não vale a pena jogar água no moinho da mitologia patronal, assinando um acordo que trás imensas dúvidas e perigos, e rebaixa nossas reivindicações e conceitos.
Primeiro problema: O debate principal e essencial das metas abusivas e os mecanismos para impor aos bancários sua superação é desviado, reduzindo o problema a conflitos interpessoais. É o bancário contra o bancário!
Segundo problema: O protocolo cria mecanismos para encaminhamento de denúncias onde o trabalhador precisa se identificar, sendo que a investigação estará a cargo do banco que tem 60 dias para dar uma resposta.
Tenho muito receio de estimular os bancários a denunciar para o banco, identificando-se. O programa não dá nenhuma segurança para o denunciante.
Sempre nos preocupamos em preservar o denunciante pois aprendemos com nossa militância que “não dá para confiar em patrão”, pois como nos ensina Marx, “não depende da boa ou má vontade do capitalista individual. A livre concorrência impõe a cada capitalista individualmente, como leis inexoráveis, as leis imanentes da produção capitalista”.
Terceiro problema: Pode criar a ilusão de que os bancos são bem intencionados, desarmando a categoria no necessário enfrentamento de classe. A Segurança do Trabalho afirma que utilizar um Equipamento de Proteção Individual (EPI) danificado, com a ilusão de estar protegido, é extremamente perigoso.
Quarto problema: Não garante a participação do sindicato no processo de apuração das denúncias. Esta garantia seria fundamental para que o bancário denunciante se sinta acolhido, protegido no processo de apuração. Uma apuração de denúncia mal encaminhada pode produzir prova contra o denunciante, em favor do banco e do denunciado.
Quinto problema: A exemplo de outros programas cosméticos como Programa de Prevenção da LER e Programa de Reabilitação Ocupacional acordados com a FENABAN, esse tende a não ter eficácia. Além disso pode trazer prejuízos. Já nos deparamos com o Programa de Prevenção de LER anexado, como defesa, em vários processos que o sindicato ajuizou contra os bancos.
Principal problema: Rebaixa nossos conceitos - O sofrimento e adoecimento imposto aos trabalhadores são originados pela forma como se organiza o trabalho, gerando a violência organizacional!
Quando adota-se o conceito de conflitos no trabalho joga-se água no moinho da visão patronal que sempre busca descaracterizar o nexo com a organização, individualizando o problema.
Esse tipo de acordo materializa uma visão sindical de colaboracionismo. Desarma ideologicamente a classe, sem avanços efetivos.
Como afirmam Araújo e Ferraz, “a parceria sindicato-empresa tende a ser um item da pauta política do sindicalismo atual. A absorção desse pressuposto está embasada na ideologia da qualidade total. Nela procura-se estabelecer com o trabalhador uma relação de igualdade de interesses, onde o empregado assuma a posição de colaborador. O discurso ideológico tem poder de persuasão e atinge os dirigentes sindicais que assumem essa tipologia...Ao se reconhecer como colaborador do capital, ele adere à ideia de conjunção de interesses, ao mesmo tempo, distancia-se da possibilidade de constatar o conflito de classe, favorecendo o processo de subsunção ao capital”.
Essa lógica colabora para construir o mito da não-violência, pois os bancos afirmam que as metas não são abusivas, “são desafiadoras”, e que os conflitos são fruto da ação de indivíduos, não tendo nada a ver com a organização.
Os bancos afirmam que a Violência é algo acidental, um surto, uma onda, uma epidemia (de perversos?). A violência é passageira, momentânea e pode ser afastada.
Assim a função do mito é admitir que o assédio/conflito existe (é um fato inegável) mas assegurando que não possui um laço essencial com a política dos bancos.
Nossa função é de desmascarar os mitos construídos pelo patrão, desvelando a realidade. Saber os motivos reais do sofrimento é passo essencial para adquirir consciência plena para resistir/enfrentar a exploração.
Minha posição de defender a não assinatura do acordo pode ser de um “Dom Quixote” enfrentando os “moinhos de vento”, mas creio que o acordo é prejudicial e que não estamos numa fase defensiva.
Temos vários exemplos de que é possível fazer o enfrentamento com ação sindical concreta e ofensiva, utilizando a legislação vigente e a organização dos trabalhadores.
Luto para que “o individualismo exacerbado que marca a modernidade não sirva como argumento para uma ação fragmentada, onde os interesses coletivos são dissolvidos e as pautas sindicais assumem a flexibilidade necessária para as prioridades do capital”. (Araújo e Ferraz)
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