“Que pueril ingenuidade a de apresentar a própria impaciência como argumento teórico!” (F. Engels; Programa dos Comunardos-bIanquistas, no jornal social-democrata alemão Volksstaat*2 ,1874,
Em
1920, ainda recuperando-se dos ferimentos sofridos pelo atentado a
tiros de 1918, Lenin escreveu um panfleto em que condenou a extrema
esquerda européia pelo seu radicalismo, por seu excesso de
"purismo". Naquela ocasião, definiu o "esquerdismo"
deles como uma "doença infantil do comunismo".
Acho
que é possível evocar esse jogo de palavras para a atualidade, onde
estamos vendo setores de “esquerda” resvalar para a crítica
sistemática e vazia, não conseguindo desenvolver a necessária
análise da complexidade do momento.
A
criança mimada esperneia quando tem alguma frustração. Quando
adolecente, via-de-regra, revolta-se contra os pais. Na política
marxista aprendi que não podemos nos dar ao luxo do infantilismo sob
o risco de não analisarmos adequadamente a realidade e sermos
condizidos a uma prática que fortalece nossos inimigos.
A
política, quando adjetivada em excesso, fraciona, confunde. Acaba
por cair na polarização do bem contra o mal. Nós, os corajosos
contra os covardes. Nós os éticos contra os que flertam com os
corruptos. Nós os combativos contra os pelegos.
A
realidade é mais complexa e o momento impõe a capacidade de
compreender as várias nuances da conjuntura. É essencial a busca
intransigente da unidade. Precisamos ter a capacidade da
tolerância, compreender as limitações de todos e não operarmos a
política oportunista da adjetivação a todos e a tudo, escondendo
objetivos obcecados de disputas de espaços e aparatos.
Essas
posições oportunistas que são contra tudo e a todos, sem apontar
saídas, é uma visão que cada dia tem menos audiência. Os
joãozinhos do passo certo é uma fórmula fácil, mas de fôlego
curto.
A
relação do movimento com governos de esquerda é um debate
histórico do movimento dos trabalhadores. Temos certeza de que é
pressuposto manter-nos na trincheira, defendendo os direitos dos
trabalhadores, de forma autônoma.
Mas
é essencial, também, envolver os trabalhadores na mudança social,
refletir incessantemente na busca de formas mobilizatórias para a
necessária resistência aos ataques e na luta para termos avanços
sociais, sem botar água no moínho da direita, jogando fora a água,
a bacia e o nenem.
Se
somente coragem resolvesse o problema, tenho certeza que estariamos
em melhor situação. Temos, no movimento sindical, valorosos e
corajosos companheiros. Mas o bicho é mais cabeludo, já estou
careca de saber.
Não
temos o direito de ser principistas infantis. “O governo me traiu,
me frustrou”. Só se frustra quem se ilude. Devemos sempre ter
claro as limitações do Estado e que as mudanças ocorrem e
ocorrerão através da luta social.
Como
afirma Boaventura Santos, hoje precisamos de rebeldes competentes,
que devem conjugar razões convincentes a paixões mobilizadoras.
Vivemos
em uma sociedade individualizada, onde ocorrem muitas mobilizações,
mas de forma dispersa. Um primeiro desafio: unir todos os
movimentos em uma pauta apaixonante e mobilizadora.
Um
outro elemento é conseguirmos sair da pauta da direita que prega o
moralismo intenso. Isso sem transigir com a corrupção e ao abandono
de compromissos com os trabalhadores.
Temos
claro que o movimento sindical está com dificuldades de dar as
respostas devidas para a realidade. Mas essa dificuldade não é de
direção, como o discurso fácil de quem só quer disputar aparatos.
ah, se fosse tão simples!
As
respostas devem ser buscadas, mas não existe receita de bolo. O
caminho se descobre ao caminhar. “...
seria simplesmente um charlatão quem pretendesse inventar para os
operários uma receita que desse antecipadamente soluções adequadas
para todas as circunstâncias da vida ou prometesse que na política
do proletariado revolucionário não surgirão nunca dificuldades nem
situações complicadas”.
(Lênin - Esquerdismo Doença infantil do comunismo, pág. 29).
Compreender
os fatores pelos quais lutamos e atuamos em um mesmo objetivo, é a
questão essencial. Se o que nos une é a indignação contra a
opressão aos trabalhadores; o inconformismo com o modo de produção
capitalista; a firme convicção de que é necessário um novo
sistema social, socialista, onde a solidariedade, a igualdade
substantiva, a liberdade devem ser seus pilares, certamente iremos
juntos dando nossa contribuição na caminhada necessária.
Precisamos conscientemente compreender as dificuldades e achar, na
prática e na teoria, saídas emancipatórias.
Mas
para isso necessitamos definir um “norte”, com unidade de ideal,
dentro da ética revolucionária, para além do mero discurso.
Não
podemos almejar o poder pelo poder, sem conteúdo transformador, o
que acaba por reproduzir a mesmice na inércia, reproduzindo a lógica
do capital. Nunca perdendo de vista que existe uma disputa entre
classes, por mais que aparentemente isso esteja diluído.
Devemos
buscar contribuir na construção de uma estratégia de longo
alcance, ousada e criativa. Para isso talvez o próprio movimento
sindical (todos os atores, não só os que eu combato), terá que se
questionar de alto a baixo.
“É melhor que seja o movimento
sindical a questionar-se a si próprio e por sua iniciativa, até
porque, se o não fizer, acabará por ser questionado a partir de
fora (Boaventura, p. 384, Gramática do tempo)
A
realidade está impondo a necessidade de reinventar nossa atuação.
Reinventar não significa negar os elementos positivos até aqui
alcançados, mas compreender seus limites e a necessidade superar
barreiras.
É inegável a saturação da relação política, fruto
da difícil realidade e da falta de objetivos comuns. Mas também é
consequência do acomodamento, da burocratização imposta pela
rotina despolitizada. Os conflitos despolitizados atestam a falta de
capacidade de elaboração e uma falta de direção comum.
Para
superar vejo importante que tenhamos propostas que unifiquem
politicamente, onde seja resgatada a unidade na ação, definindo
coletivamente as estratégias, mas que coletivamente também sejam
cobradas responsabilidades. Isso tudo implementado com a máxima
ampliação de pessoas envolvidas na militância.
Nesse momento de
dificuldades do sindicalismo, mais do que nunca, precisamos
incorporar ativistas para potencializar a construção da luta.
Sem
choro nem vela, sem ranços, precisamos defender um sindicalismo
ativo e inquieto, mas também competente para mobilizar paixões com
razões convincentes.
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